A série “Mulheres pela Ciências Exatas” destaca a carreira de professoras do Setor de Ciências Exatas e o envolvimento delas na produção acadêmica dentro e fora da Universidade Federal do Paraná (UFPR). A terceira reportagem é sobre a professora do Departamento de Matemática e Coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Matemática, Elizabeth Wegner Karas. Docente da UFPR desde 1990, Elizabeth é reconhecida no campo da Matemática Aplicada e se destaca entre os pesquisadores da universidade. Além de fazer parte do grupo seleto de bolsistas produtividade em pesquisa do CNPq, ela também já recebeu o prêmio Guilherme de la Penha, da Sociedade Brasileira de Matemática Aplicada e Computacional (SBMAC).
A paixão de Elizabeth pela Matemática já dava pistas quando criança. Se tinha uma coisa que a deixava animada era ajudar seu pai (que era o responsável pelas planilhas de compras de materiais para uma empresa de construção civil) quando ele levava “serviço para casa”. Quebra-cabeças de pesquisa de preços, cálculos minuciosos e tabelas eram como jogos infantis. “Meu pai nem imaginava que aqueles momentos marcariam tanto a minha trajetória”, conta.
Durante o Ensino Médio, ao cursar o técnico de Desenho Arquitetônico no Colégio Estadual do Paraná, Elizabeth conheceu a sua segunda inspiração no campo da Matemática: a professora Arlete Mendes. Foi ela uma grande incentivadora, ao ponto de pagar para Elizabeth as inscrições para o vestibular em Engenharia Cartográfica, na UFPR, e em Matemática, na Pontifícia Universidade Católica do Paraná. A aluna fez jus e passou nos dois cursos.
O pontapé inicial da professora Arlete Mendes foi só o começo. Elizabeth fez Especialização em Informática na Metodologia do Ensino Superior; Mestrado em Matemática Aplicada, na Universidade de São Paulo (USP); Doutorado em cotutela de tese em Engenharia de Produção, pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e em Matemática Aplicada pela Paris I – Panthéon Sorbonne; Pós-Doutorado no Instituto de Tecnologia de Tóquio e Pós-Doutorado na Academia Chinesa de Ciências.
UFPR
Se tornar professora aconteceu. Há mais de 30 anos dando aulas, Elizabeth começou na PUCPR, até que em 1990 prestou concurso público para lecionar da UFPR. Daqui ela nunca mais saiu. “Eu estou em sala de aula desde abril de 1987. É uma carreira que eu sou apaixonada. Adoro sala de aula, adoro estar em contato com os alunos e acho que consigo transmitir esse gosto para eles”.
Além da dedicação em sala de aula, a professora também tem a paixão pela pesquisa na Matemática. No Setor de Ciências Exatas ela é uma referência, resultado também da consciência do seu papel dentro de uma universidade pública. Elizabeth defende que possui uma grande dívida com a sociedade, pelos investimentos que recebeu em sua carreira.
“Todo o meu Ensino Fundamental e Médio foram em escolas públicas. No meu Mestrado, dois Doutorados e dos Pós-Doutorados recebi recurso público. Por fim, venho trabalhar em uma universidade pública. Eu tenho que dar esse retorno para a universidade e para a sociedade. E como procuro dar retorno? Dando boas aulas, passando bons exemplos pros nossos alunos e fazendo boa pesquisa”, argumenta a professora.
Pesquisa
Se faz sentido a expressão “quem conta um conto aumenta um ponto”, Elizabeth se orgulha em contar para todos o primeiro marco em sua carreira na pesquisa. Aconteceu numa noite de inverno, ao conhecer o professor Celso Penteado Serra quando esperavam o ônibus. O encontro fez surgir uma amizade, uma pesquisa sobre fractais e o livro Fractais gerados por sistemas dinâmicos complexos (1997), escrito pelos dois professores.
Segundo Elizabeth, fractais são figuras geométricas com padrões repetitivos e alto grau de detalhamento, produzidas por equações matemáticas e que podem ser estudadas e interpretadas por programas de computador. O estudo acabou se mostrando útil, também, para a medicina, quando os professores foram procurados por um aluno do curso da saúde para propor uma parceria em um projeto sobre Aplicação da Geometria Fractal na avaliação de tumores na boca. “Foi uma ótima experiência, que começou com uma conversa de ponto de ônibus. Gosto de ver como as pequenas atitudes diárias podem mudar o ciclo das coisas”.
Atualmente, Elizabeth tem se dedicado à pesquisa na área de Otimização Contínua, que tem foco de interesse na minimização ou maximização de uma função. Além de artigos científicos, a professora publicou em 2013 o livro Otimização Contínua: aspectos teóricos e computacionais, com coautoria do professor do Departamento de Matemática da UFPR, Ademir Alves Ribeiro.
Nesse campo, Elizabeth faz parte de um projeto de inovação e desenvolvimento em parceria entre a UFPR, Copel e Institutos Lactec. O objetivo é propor estratégias eficientes para o planejamento hidrotérmico do sistema brasileiro. A pesquisadora conta que um dos prazeres deste projeto é a oportunidade de trabalhar com ex-alunas da UFPR, graduadas na primeira turma do curso de Matemática Industrial e doutoras em Métodos Numéricos em Engenharia pela universidade. “Além de estar trabalhando com ex-alunas, o projeto tem sido gratificante por possibilitar a aplicação de algoritmos de filtro, propostos na minha tese de doutorado em problemas reais de grande porte”, relata.
De uma professora que investe e faz muita pesquisa na UFPR, Elizabeth se preocupa com o futuro da produção científica no Brasil. Ela conta que, trabalhando na universidade desde 1990, já viu muitas mudanças e a expansão da universidade, principalmente a partir de 2002. “ Vimos o Politécnico mudando e um resgate para trazer os alunas mulheres, alunos negros, alunos pobres para dentro da universidade. Uma política de inclusão que é fundamental. Os tempos agora são outros, eu estou assustada. Um país que não tem pesquisa, fica a mercê dos interesses internacionais”
Mulheres
Elizabeth é, atualmente, coordenadora do Programa de Pós-Graduação em Matemática (PPGM) da UFPR. Não é a primeira vez que a professora assume esse cargo, e também já participou de comitês na Capes, como a Comissão de Avaliação Quadrienal dos Programas de Pós-Graduação. Essas experiências são importantes no sentido de mulheres ocuparem mais espaços na área de Ciências Exatas, segundo Elizabeth.
“Se as alunas na Pós-Graduação e na Graduação não enxergam as mulheres, vão sendo desencorajadas. A proporção de mulheres numa turma diminui bastante da graduação para o mestrado e depois para doutorado. Já tive aluna que eu implorei para vir fazer mestrado, às vezes uma conversa pode ajudar a enxergar que pode ser diferente”, argumenta.
Atualmente na UFPR, 45% da turma de calouros dos cursos de Matemática e Matemática Industrial é mulher. No Mestrado do PPGM, 35% dos matriculados são mulheres (5 de 14 alunos), enquanto que no Doutorado o número diminui para 22% (6 de 27 alunos).
Diante da diferença entre a presença feminina para a masculina na área da Ciências Exatas, a pesquisadora conta dos esforços realizados para mudar esse cenário. Alguns deles são: o ciclo de debates “Matemática Substantivo Feminino”, que Elizabeth foi palestrante durante o I Encontro Paranaense de Mulheres na Matemática, realizado em Curitiba no mês de abril; e o edital do CNPq, ““Meninas nas Exatas, Engenharias e Computação”, que recebe projetos de pesquisadoras em âmbito nacional e do qual Elizabeth irá participar.
Em mais de 30 anos dedicados ao ensino, extensão e pesquisa, que são os pilares norteadores da UFPR, a professora continua dedicada por todo o trabalho que realiza dentro e fora da universidade. “Minhas escolhas sempre foram baseadas na realização pessoal. Parto do princípio de que fazemos bem feito quando fazemos o que gostamos. O resto é consequência”, conclui Elizabeth.
Por Maria Fernanda Mileski